Testemunho de Dom Geraldo Maria de Moraes Penido
Arcebispo-emérito de Aparecida (SP), a respeito de Madre Gema da Eucaristia, OCD, Fundadora e priora algumas vezes do Carmelo Nossa Senhora Aparecida de Belo Horizonte – MG
Que dizer desta pessoa extraordinária?
No meu testemunho sobre Madre Gema, como costumo fazer quando trato da ação de Deus sobre o homem, posso dividir o meu testemunho, apreciando a dimensão humana de sua personalidade e em seguida visão sobrenatural que a sua pessoa nos oferece.
Sem dúvida, estas duas dimensões numa pessoa, como Madre Gema, parecem confundir-se. Elas se permeabilizam. E por isto é um todo integral. É o natural a serviço do sobrenatural. O sobrenatural a ungir toda a riqueza do natural, da personalidade de Madre Gema.
Em primeiro lugar, trata-se a meu ver, de uma pessoa sumamente inteligente. Dotada de Q.I. muito elevado. Em conseqüência tem uma acuidade mental que se fora aproveitada, ou melhor, explorada no campo das ciências, certamente ela teria conquistado as maiores vitórias da universidade por exemplo. A par desta inteligência dotada de uma acuidade muito grande, a sua personalidade é dotada de uma bondade extrema. A bondade que se mostra no seu sorriso, nos seus gestos, na sua palavra. Mas sobretudo uma bondade que tolera, uma bondade que compreende, uma bondade que eleva o irmão. Além desta bondade, nota-se em Madre Gema, uma capacidade enorme de amar o irmão, de amar a suas filhas do Carmelo, e, em conseqüência, amar também o mundo como explicitou o Concílio Vaticano II, quer na Constituição Lumen Gentium, que na Gaudium et Spes. Personalidade rica, personalidade dotada de uma percepção psíquica invulgar, o seu olhar é destes olhares penetrantes, capazes talvez de adivinhar o que a pessoa quer, antes mesmo que o interlocutor lhe diga qualquer coisa.
Este seria um retrato das qualidades naturais em Madre Gema.
A mim me parece que nesta altura do meu depoimento eu já estou meio confundido. Já estou a pensar que o que eu disse não é da esfera puramente natural. Tudo isto que nela se manifesta é uma derivação natural da sua vida sobrenatural. Conheço a Madre Gema há muitos anos, isto é, desde 1943, quando comecei o meu magistério no Seminário de Belo Horizonte, após o meu retorno de Roma. Ela tem um olhar penetrante, um olhar que parece ler as almas, ler os corações. Será isto apenas uma capacidade natural que tem a pessoa? Será isto apenas inteligência invulgar, ou será um dom do Espírito Santo que ela goza? Mas em verdade já estou passando para a visão sobrenatural da sua personalidade; na verdade Madre Gema vive a vida sobrenatural em plenitude. Vê-se quase como sensível, quase perceptível, que ela vive tranqüilamente, serenamente, com naturalidade a visão de Deus. É isto uma das características das almas santas.
É notável que ela tenha tido nestas alturas da vida da graça a que ela chegou, para conosco que vivemos na planície, para com os homens que vivem cá no mundo, uma compreensão, uma bondade, e uma percepção muito grande do coração humano. Daí este sentido de abertura que tem a alma de Madre Gema. Neste mundo que se seguiu após a guerra, a última guerra, e mais precisamente nesta agitação que a Igreja viveu após a guerra, porém mais acentuadamente nos dias do concílio e ainda mais acentuadamente no pós-concílio, quando se tratou, ou se tratava da renovação de tudo, foi notável ver em Madre Gema a capacidade de adaptar-se, a capacidade de ver o mundo com outros olhos. Certamente ela pertence àquela visão teresiana, de um Carmelo vivendo a vida carmelitana em todo o seu rigor, e, em conseqüência, em todo seu esplendor. Entretanto ela não teve dificuldade em admitir colocações novas que se pusessem ou se venham pondo à vida carmelitana, contanto, é verdade, que se salvasse esta espiritualidade tão rica, este espírito tão profundo do silêncio, da solidão, do deserto, em que a alma vive para poder mergulhar em Deus e viver somente n’Ele, por Ele e para Ele.
Deste modo, ao mesmo tempo em que Madre Gema se esforça por compreender o mundo de hoje, a Igreja de hoje, os Bispos de hoje, os Padres de hoje, as jovens de hoje, eu acredito que no seu coração deve ter havido muito sofrimento, uma espécie de parto espiritual para compreender, gerando, estas almas que o Espírito Santo vai suscitando nos novos tempos, ávidas de viver o espírito evangélico, mas ao mesmo tempo com conotações que traduzem um espírito bem diferente do espírito de trinta anos atrás. Madre Gema é de uma humildade encantadora. Com a capacidade que ela possui, com a sua virtude tão elevada, com a sua inteligência que com muita facilidade penetra até nos ensinamentos mais profundos da teologia e sobretudo os vive, não ostenta isto. Ela gosta de se apresentar como uma criatura pequenina, como uma criatura que nada vale. Nisto ela parece muito com Teresa do Menino Jesus, como se parece muito com Teresa Ávila na profundidade de sua vivência e nas alturas de sua contemplação.
Madre Gema, vivendo os dons do Espírito Santo, vivendo especialmente ao toque e ao impulso dinamizador das virtudes teologais, conta para todo mundo o que é viver da fé; o que é viver na esperança, mas especialíssimamente o que é viver o amor. Eis o que eu penso de Madre Gema. Num retrato pálido de dentro de quatro ou cinco minutos, eu não poderia dizer tudo o que eu penso. Diria apenas, acho uma criatura extraordinária. De Pio XII eu escrevi um dia: era um gênio da natureza e da graça! Estou pensando que posso dizer a mesma coisa de Madre Gema. Um gênio da natureza e da graça! Os seus dotes naturais, a sua riqueza psicológica, toda a beleza da sua personalidade, tudo isto ficou que transfundido, eu quase diria “transubstanciando” na vivência da graça santificante. Em suma, é a santidade que envolve a criatura toda e a ela leva para Deus. Nisto me parece a mim, que Madre Gema tem muito também de Elizabeth de la Trinité, que viveu silenciosamente o dogma da Trindade, isto é, viveu Deus vivendo na alma dela. Assim á Madre Gema já não é mais criança, mas sobretudo é uma criatura sofredora, uma criatura que por muitas e muitas vezes andou por hospitais. Sua saúde tão débil é conservada eu diria, por uma designação especial da bondade de Deus. É que Deus o Pai, Cristo Redentor e o Espírito Santificador ainda precisam de Madre Gema na terra. Como ela resiste a tantos achaques, a tantas doenças, eu não sei, nem os médicos dirão. Mas Deus sabe. É que Ele ainda precisa dela aqui na terra. Nós precisamos dela aqui na terra. Que Madre Gema possa viver muito para dar ao mundo todo o esplendor de sua virtude, toda sua bondade e aquele olhar penetrante que lê na alma, advinha os corações. E naquele mesmo olhar que a gente percebe que penetra a alma da gente sente-se que vai também toda uma gama de valores fundados no amor, penetrando os corações.
Ela os ama em Cristo Jesus Nosso Senhor.
(Transcrito do gravador)