Nenhum santo deixou tantas fotografias como Teresa Martin, a célebre santa de Lisieux. Vendo o seu álbum de fotografias podemos segui-la ao longo do caminho da sua vida.
Aqui é uma menina de três anos, com uma mão sobre o braço de uma cadeira. É claro que já tem consciência de si.
Aqui é uma menina de oito anos em companhia da irmã Celina. Segura uma corda para pular, mas não dá a impressão de brincar muito disso. Os seus cabelos estão penteados em longos cachos com uma franjinha de caracóis em torno da sua fronte.
Aqui é uma jovenzinha de treze anos com um gracioso olhar aberto, que olha o futuro como todo adolescente.
Aos quinze anos, com os cabelos presos num elegante coque, se prepara para impressionar o bispo com a sua precoce maturidade.
Segue toda uma série de fotografias que retratam a vida de carmelita por ela escolhida, muitas das quais feitas pela irmã Celina, que tinha uma máquina fotográfica: Teresa com as noviças; Teresa em pose com as três irmãs carmelitas e a prima; Teresa que interpreta o papel de Joana D’Arc num drama que ela mesma escrevera, atribuindo-se o papel da protagonista; Teresa que recolhe o feno junto à comunidade, que está junto à uma mesa como sacristã, enquanto tem em mão uma ampulheta. Não é necessária olhar muito estas fotografias para descobrir seu olhar num grupo, o queixo forte e a boca decidida, os límpidos olhos claros, a estatura relativamente alta para uma mulher do seu tempo.
Existem fotos de Teresa só, com olhos circundados de negro por causa de uma enfermidade devastadora, outras que a mostram pálida, deitada sobre um leito improvisado no ar aberto.
Na maior parte das fotos, Teresa tem o aspecto de uma jovem qualquer do seu tempo e da sua cultura, que vive como as companheiras. Entretanto, esta mulher foi definida como a mais grande santa dos tempos modernos. Quem é e em que consiste a sua santidade? Sobretudo, como pode revelar hoje a nós o segredo que a santidade é acessível a todos?
Nada na infância de Teresa deixa pressupor a sua futura santidade. Nasceu aos 2 de janeiro de 1873 em Alençon, na Normandia, filha de Luiz e Zélia Martin, última dos seus nove filhos, dos quais sobreviveram cinco meninas: Maria, Paulina, Leônia, Celina e Teresa. Como freqüentemente ocorre, as duas maiores e as duas menores tornaram-se íntimas confidentes, enquanto aquela «do meio», Leônia, se sentia ignorada, diferente, e com efeito foi a única irmã que não entrou, como pareceria natural, no mesmo convento das outras quatro.
Zélia Martin foi a pessoa mais importante nesta família. Era uma mulher muito ativa, que desenvolvia em casa uma atividade de criação de rendas, enquanto o marido tinha abandonado a atividade de relojoeiro. Zélia adorava as suas meninas, lhes enfeitava e as apresentava com orgulha (com exceção de Leônia, que tinha a capacidade de estar no modelo típico da família).
Teresa, a última nascida, foi acolhida com alegria e freqüentemente acariciada. Todos as suas primeiras recordações, dizia, foram de sorrisos e carícias, embora não fosse mimada por ninguém, com exceção do afeiçoadíssimo pai.
Mas Zélia começava a apresentar os sinais de câncer no seio, que enfim a levaria à morte. Não pode amamentar a pequena, e Teresa foi confiada à uma ama.
Por quatro anos, até a morte de Zélia, Teresa cresceu como uma menina confiante e afetuosa.
Voltando atrás com a memória, recordou um episódio que considerava indicativo da sua atitude em relação da vida. Ela e sua irmã Celina estavam jogando no jardim quando chegou Leônia com um cestinho cheio de vestidinhos para as bonecas, fitas e retalhos de tecido, sobre os quais havia colocado a sua boneca. Leônia havia decidido que era muito grande para aqueles brinquedos, assim convidou as irmãzinhas para tomar do cesto aquilo que queriam. Celina escolheu educadamente um novelo de fita colorida. Teresa refletiu, e improvisamente exclamou: «Eu escolho tudo», e saiu com tudo o que havia sobrado.
Isto tornara-se o sinal distintivo da sua santidade: «Eu escolho tudo». Eu escolho tudo o que Deus escolheu de oferecer-me. Não quero ser santa pela metade. Eu quero tudo, e estendo as minhas mãos para acolher este Dom na sua plenitude. Teresa repetira e aperfeiçoara muitas vezes esta atitude precoce.
Com a morte da mãe, em 1877, a menina de quatro anos se sentiu destruída. A casa de Alençon foi vendida e os Martin se transferiram para Lisieux para ficarem próximos ao irmão de Zélia e à sua família. Luis tornou-se quase um eremita: vivia só para as suas filhas e as práticas religiosas. Era afeiçoadíssimo à Teresa. Era a sua «rainhazinha». Enchia o mundo da pequena e tornou-se o seu centro de interesse fundamental. Paulina foi nomeada «a Segunda mãe» de Teresa, mas ninguém pode tomar verdadeiramente o lugar de Zélia.
A morte da mãe transformou Teresa numa jovenzinha introvertida, excessivamente sensível, temerosa em relação aos estranhos. No interior do convívio familiar conseguia abrir-se e a ser feliz, mas o seu temperamento, antes descuidado, tornou-se inclinado aos escrúpulos. Ela encontrava refúgio e segurança só nas práticas religiosas e no seu crescente interesse pela oração.
O povo de Lisieux a definida como uma menina tímida e fechada.
Por um breve período, Teresa freqüentou uma escola próxima à sua casa, dirigida pelas beneditinas. Foi uma experiência infeliz. As meninas da sua idade, com os seus olhos competitivos e as pequenas realidade, a desconcertaram. Depois, para a sua desorientação, Paulina deixou a casa para tornar-se monja e Teresa perdeu a sua «segunda mamãe». Esta perda provocou o que pode ser definido como um forte esgotamento nervoso.
Teresa foi atingida por distúrbios preocupantes psicossomáticos: tremores violentos, espasmos, alucinações. Por dois meses a sua saúde a até a sua vida correram perigo. Mas já se entrevia, sob a superfície, que aquela jovenzinha fácil ao choro e excessivamente sensível estava desenvolvendo uma força secreta. Lutou para superar as lágrimas. Queria verdadeiramente agrades a Deus. Queria estar pronta a todo custo às exigências da consciência. A sua primeira comunhão foi um dia de graça, de encontro pessoa com Jesus. Decidiu doar-se completamente a ele, embora sentindo-se tão limitada e fraca!
Quando aproximou-se dos seus quatorze anos, o pensamento da vida religiosa que cultivava já há muito tempo, recebeu novo impulso. Queria unir-se às suas irmãs Maria e Paulina no Carmelo de Lisieux, mas era considerada muito jovem para enfrentar um tal estilo de vida. O pai porém deu o seu consentimento, e ela decidiu de lutar para obter a permissão necessária, dirigindo-se por primeiro ao superior do convento, depois ao bispo. Quando o bispo se mostrou hesitante, Teresa, junto ao pai e a inseparável Celina, se uniu a uma peregrinação para Roma, determinada a pedir ao próprio Papa de ouvir o seu pedido.
Foi uma experiência de abertura à um vasto raio para esta jovem de província, com tudo aquilo que comportou, uma longa viagem que culminou com uma audiência do Papa aos peregrinos. Celina e Teresa estavam na fila junto as outras senhoras, com um véu negro cobrindo os seus cabelos loiros. Improvisadamente, Teresa sentiu que estava perdendo a coragem. Foi anunciado que os presentes não deviam falar com o Papa, e ela sempre fora obediente! Tremia enquanto se aproximava do trono de Leão XIII.
«Fala», encorajou-a Celina a intrépida (o sobrenome que lhe fora dado em casa). Teresa recolheu toda a sua coragem e pediu ao Papa de permitir-lhe de entrar no Carmelo aos quinze anos. Estava tão conturbada que repetiu o seu pedido, apoiando-se sobre os joelhos, enquanto as lágrimas escorriam copiosa sobre sua face, e as guardas pontifícias olhavam com desaprovação aquela manifestação de emotividade.
O Papa aconselhou a Teresa de fazer o que diziam os superior. Mas isto não era o bastante para a jovem que havia escolhido tudo. Insistiu, enquanto os guardas a tiravam dos joelhos do Papa: «Sim, mas se vós dizeis uma única palavra, Beatíssimo Padre, todos estariam de acordo». Leão XIII deve Ter sorrido diante daquela devota obstinação, enquanto replicava: «Bem, bem; se Deus quiser que vós entreis, entrareis».
Pobre Teresa! Todo aquele esforço e nenhum resultado concreto! Retornou a Lisieux desiludida, mas a sua coragem fora considerada. Depois do Natal chegou da parte do bispo a permissão necessária. O caminho se lhe abria!
Assim aos quinze anos, superados os obstáculos, Teresa batia à porta do Carmelo, aos 9 de abril de 1888, pronta para empreender o caminho que havia escolhido. Os seus cabelos loiros estavam recolhidos sobre a nuca e vestia um gracioso vestido azul, como uma típica adolescente. Ao seu redor todos os familiares choravam, mas ele ficou calma, determinada e resolvida. A sua infância havia terminado. Estava se dispondo a tornar-se uma santa.
A Ordem escolhida era a das Carmelitas reformada por Santa Teresa d’Ávila no século XVI. A vida de uma monja no Carmo era um sutil equilíbrio entre solidão, trabalho e vida comunitária, tudo a serviço de uma oração contínua. Teresa assumiu com entusiasmo aquele estilo de vida. Era aquilo que ela desejava. Foi a sua contribuição à Igreja do seu tempo; através da oração levaria almas ao Senhor.
Mas como poderia suportar o deserto aquela jovem acariciada, criada tão piamente e protegida? Ela aí mergulho e descobriu aspectos de si mesma que antes não sabia que tivesse: a capacidade de suportar, de aceitar-se com desconcertante sinceridade. A chave era o amor e a confiança; o amor por Deus e pelos outros, a fidelidade à própria consciência, uma incansável busca da verdade nas Escrituras, em particular nas palavras de Jesus e a confiança na sua misericórdia e no seu poder.
Era um compromisso tão comum que todos nos possamos identificar com Teresa enquanto lutava para encontrar e chegar ao melhor de si. Combateu, como devemos fazer todos nós, contra os defeitos do seu caráter, compreendendo a necessidade de estabelecer e cultivar relações com as pessoas por que havia pouca simpatia, a exigência de um tempo prolongada para a oração quando Deus parecia ausente; aceitou o frio, a alimentação desagradável, o cansaço cotidiano. Mas havia também os tempos das celebrações, os momentos felizes da conversação e do afeto, as funções e os ideais partilhados, que constituíam a substância da maior parte da vida.
Uma prova que a fez sofrer indizivelmente foi o golpe do seu adorado papai, pouco tempo depois de sua entrada no convento. Algumas vezes já, anteriormente, as suas faculdades físicas e mentais pareciam diminuir, mas não davam motivo de verdadeira preocupação. É possível que o afastamento da sua filha mais jovem e preferida tenha sido o golpe final que abalou a sua mente. Naquele tempo eram pouca compreensão e sensibilidade em relação a doença mental. Luis Martin apresentava falhas de memória, impulsos para fugir, reações violentas, todos sintomas que hoje poderia ser referidos ao mal de Alzheimer. Esteve presente quando Teresa recebeu o hábito, o seu último «triunfo» quando o vestiu; durante os meses sucessivos foi internado num instituto em Caen. Toda a família sofreu e foi humilhada pelo seu destino. Somente quando se apresentou a paralisia e Luis não podia ser considerado um perigo para si e para os outros lhe foi permitido de retornar para casa, onde Leônia e Celina o cuidaram até a sua morte.
Também Teresa, no fim de sua vida, enfrentou um período de grande escuridão, quando lhe pareceu de Ter perdido a fé. Provou pela primeira vez a desconcertante experiência da ausência de Deus, unida no seu caso aos danos da tuberculose e às contrastantes emoções em previsão de uma morte eminente.
Aos vinte e quatro anos Teresa estava morrendo. Na Quinta-feira Santa de março de 1896 começou a sofrer de hemoptises. Confiou à superiora, a Madre Maria do Gonzaga, mas pediu não Ter tratamentos especiais e não os recebeu nenhum. A tuberculose avançou rapidamente.
De noite sofria pelos ataques de tosse, febre, fraqueza. A sua superiora, que parecia considerar tudo isto como uma oportunidade de colher «para o bem da alma de Teresa», refutou de fazer-lhe administrar morfina. Pensamentos de suicídio e de esgotamento atravessaram a mente da enferma vítima da febre. «Sofro somente – dizia – um minuto após outro». Parecia que Deus lhe tivesse esquecido.
Entretanto esta jovem mulher, que havia conduzido uma vida tão simples, foi logo reconhecida como uma santa.
No seu esgotamento e na aparente ruína havia combatido por amor, para viver segundo seu ideal. Havia buscado de responder com plena fé ao Senhor do seu coração, de seguir o evangelho. Permanecera firme numa fé inquebrantável, e triunfara.
Na sua lenta e doloroso amadurecimento, Teresa descobriu o núcleo da Boa Notícia. Não fora ela a escolher Deus (embora desde o início pareça assim): Deus havia a escolhido. E isto não pela sua juventude e o seu fervor, pela sua educação religiosa e a fiel observância da Regra Carmelitana, não pela sua força ou pela vontade da sua vida heróica: Deus a havia escolhido somente por amor, e ela respondera com a confiança de uma criança. Deus fora misericordioso em relação a uma criatura fraca, imperfeita e necessitada. Tudo era Dom, tudo era graça.
Está aqui a descoberta, ou melhor a redescoberta, de um caminho aberto a quem busca a santidade. A santidade consiste no amor: Deus nos ama por primeiro e espera a nossa resposta. Se Deus pode fazer de Teresa uma santa, então, há esperança para qualquer um que deseja a santidade como ela. O caminho é simples: uma fé absoluta, a fé de uma criança em seu Pai que a ama. Ela chamou este caminho «pequena via» e o ancorou na Palavra de Deus. Simples mas não fácil, a «pequena via» desafia a nossa idéia de santidade entendida como empreendimento pessoal, força de caráter, cumprimento sem defeitos de leis e normas. Ela nos insere na santificação da realidade, aqui e agora, numa vida comum, vivida no abandono à providência de Deus.
Pouco antes da sua morte Teresa escreveu: «Se todas as almas fracas e imperfeitas sentissem o que sente a menor entre eles, a alma da sua Teresa (referindo-se ao amor e à misericórdia de Deus), nenhuma se desesperaria de chegar ao cume da montanha do amor, porque Jesus não pede grandes ações, mas só o abandono e o reconhecimento».
Durante os seus últimos meses Teresa compreendeu com profunda, inexprimível certeza, que havia atingido a santidade porque fora amada e havia amado em resposta. Tivera fé em Deus e não ficara desiludida. E o caminho que havia seguido era aberto a todos aqueles que quiserem percorrê-lo.
Ao contrário dos mais tradicionais métodos de formação espiritual que exigem numerosos atos verificáveis de virtude, a via de Teresa exige somente uma coisa: «O meu Mestre, Jesus, não me ensina a contar as minhas ações, mas a fazer tudo por amor...e tudo isto na paz, em espírito de abandono. É Jesus que faz tudo, eu não faço nada».
Tradução livre de:
Sete Giorni com Teresa de Lisieux
L’Amore via alla santità
Autora: Elizabeth Ruth Obbard
Editrice Elle Di Ci
pp. 5-12
"Sinto que vou entrar no repouso...Mas sinto, sobretudo, que minha missão vai começar, minha missão de fazer amado o Bom Deus como eu o amo, de dar meu pequeno caminho às almas" (CA. 17.7)
«Viver de Amor, é dar sem medida
Sem reclamar salário aqui na terra
Ah! sem contar eu dou-me bem segura
De que, quando se ama, não se conta!...» (PO 17,5)
Colaboração do Pe. Milton Kenan Jr., de Jaboticabal (SP)